Conselho Europeu de Investigação  (ERC) atribuiu duas importantes bolsas* a cientistas do Grupo 3B's - Biomateriais, Biodegradáveis e Biomiméticos da Universidade do Minho. Alexandra Marques, doutorada em Ciência e Tecnologia de Biomaterais e Ana Rita Duarte, doutorada em Engenharia Química e mestre em Propriedade e Tecnologia de Polímeros vão receber financiamentos de cerca de dois milhões de euros nos próximos cinco anos, para criar modelos de pele 3D e estudar solventes amigos do ambiente, respetivamente.

 

O meu objetivo sempre foi contribuir para melhorar alguma coisa na sociedade.

Alexandra Marques decidiu doutorar-se na Escola de Engenharia da UMinho (2000-2004), atraída pela forte aposta desta instituição na investigação e também pela sua ligação ao tecido industrial e empresarial, ou seja, pela possibilidade de desenvolver ciência com aplicabilidade. "Nunca me vi a fazer só ciência fundamental, porque o meu objetivo sempre foi contribuir para melhorar alguma coisa na sociedade. Os biomateriais eram algo que me chamava a atenção e que podiam ter essa aplicabilidade", explica a investigadora.

Alexandra é um dos membros fundadores do Grupo 3B's, liderado pelo Professor Rui L. Reis, que tinha sido seu orientador de doutoramento. Em 2007, decidiram explorar e desenvolver novas estratégias para regenerar a pele humana, acreditando que havia ainda muito por fazer nesta área. Desde então o seu trabalho de investigação tem visado a conceção de novas estratégias de engenharia de tecidos  que recriem, de forma precisa, a sua estrutura e organização complexa, incluindo a componente vascular. Tem também estudado o papel da matriz extracelular na evolução do processo de regeneração de pele, obtendo assim resultados que são a base do seu trabalho futuro. Depois de cerca de dez anos de trabalho, a atual vice-diretora e investigadora principal deste grupo de investigação recebeu uma bolsa de Consolidação ("Consolidator Grant") do ERC, no valor de 1,99 milhões de euros, para um projeto que pretende criar modelos de pele tridimensionais que representem as pato-fisiologias de três doenças de pele raras e incuráveis: pênfigo vulgar, epidermólise bolhosa e carcinoma de células escamosas. Para isso irá usar tecido de pacientes com estas três doenças que é clinicamente removido para diagnóstico ou tratamento. A ideia é recorrer à técnica de bioprinting para produzir modelos que permitam reproduzir exatamente o posicionamento das células e também todo o ambiente à sua volta. "A pele é um tecido complexo que tem várias camadas com diferentes tipos de células que comunicam entre si. Temos de ter algum cuidado no design e aplicar o conhecimento que fomos obtendo ao logo destes anos, para construir modelos mais fiáveis e que melhor reproduzam o tecido original e apresentem muitas das funcionalidades desse tecido", explica a investigadora à Nós Alumni.  

AM.jpgAlexandra Marques num dos laboratórios do Grupo 3B's

O projeto da equipa liderada por Alexandra Marques, que cruza a biologia celular, ciência dos materiais e engenharia biomédica, pretende criar modelos de doença que podem ser usados para melhor conhecer essas doenças ou no desenvolvimento de novos medicamentos, minimizando assim a experimentação animal. Para além deste objetivo, o projeto permitirá também demonstrar que a abordagem proposta pode ser estendida em termos de aplicações e, potencialmente, dar resposta às limitações das soluções que hoje estão clinicamente disponíveis para regeneração de pele. A ex-aluna explica que esta “é uma oportunidade única para desenvolver um método capaz de criar modelos de tecidos humanos com melhor funcionalidade e, portanto, mais fidedignos, aumentando o conhecimento sobre doenças incuráveis, como o cancro da pele e que, gradualmente, comprometem a qualidade de vida dos pacientes, como é o caso da epidermólise bolhosa, contribuindo para descobrir terapias mais promissoras”. 

Sem a atribuição da bolsa a alternativa seria avançar mais lentamente, como tem acontecido até aqui. "Desta forma, conseguimos financiamento para o laboratório e a possibilidade de contratar mais pessoas para o grupo. Trata-se de um projeto ambicioso, arriscado e que custa muito dinheiro; a bolsa permite-nos chegar a bom porto mais rapidamente o que é particularmente importante quando falamos de doenças que ainda não têm cura e com uma alta taxa de mortalidade”, acrescenta a cientista. 

É uma aposta no futuro e uma validação que o caminho que estamos a seguir poderá fazer alguma diferença e poderá ter um impacto grande.

Ana Rita Duarte integrou também o Grupo 3 B's em 2007 e decidiu ingressar no mestrado em Propriedades e Tecnologia de Polímeros em 2012, considerando que era o curso que precisava para complementar o seu conhecimento e também porque, estando no Grupo, fazia todo o sentido. Sobre a sua experiência como aluna da Escola de Engenharia da UMinho, a investigadora refere que "o facto de poder fazer o mestrado na modalidade de e-learning e ter essa flexibilidade foi uma mais-valia que influenciou a minha decisão; para além disso, é uma Escola muito ativa e dinâmica e é muito estimulante trabalhar num ambiente assim".


Ana Rita DuarteA.jpg  Ana Rita Duarte com Carlos Moedas, comissário europeu para a investigação, ciência e inovação,​ num dos laboratório do Grupo 3B's​


O trabalho de investigação de Ana Rita Duarte no Grupo 3B's tem-se centrado nas "tecnologias verdes", isto é, na procura de processos ambientalmente sustentáveis e na utilização de solventes alternativos que diminuem o impacto nos processos industriais. Utilizando a tecnologia supercrítica e o dióxido de carbono como solvente, pretende produzir produtos que possam ser benéficos e que tragam valor acrescentado. "Ao utilizarmos dióxido de carbono pré-existente, não iremos produzi-lo especificamente e teremos, assim, processos mais sustentáveis. Os solventes usados atualmente são tóxicos e requerem tratamento. A ideia é procurar alternativas com eficácia semelhante, mas que sejam biodegradáveis e permitam processos mais limpos", explica a investigadora.

O projeto liderado por esta antiga aluna foi igualmente contemplado com uma bolsa de Consolidação do Conselho Europeu de Investigação no valor de 1,87 milhões de euros e pretende perceber como podem misturas de compostos naturais, como açúcares, aminoácidos ou ácidos orgânicos, atuar como solventes alternativos em engenharia química. Esta investigação está focada nas potencialidades de uma nova classe de solventes "verdes", os chamados "solventes eutécticos profundos de origem natural", que, combinados numa determinada proporção, se tornam líquidos e menos nocivos. Segundo a cientista, "estes solventes têm aplicações farmacêuticas e podem ser usados em áreas como a biocatálise e a extração, tornando os processos industriais mais sustentáveis".

A atribuição da bolsa a este projeto vai permitir consolidar uma equipa de oito pessoas a trabalhar em permanência com Ana Rita Duarte e obter respostas de uma forma mais célere, o que, de outro modo, não seria possível. Para a alumna, é extremamente gratificante receber esta bolsa porque é o reconhecimento da excelência do trabalho que tem sido desenvolvido no Grupo 3B's: "é uma aposta no futuro e uma validação que o caminho que estamos a seguir poderá fazer alguma diferença e ter impacto".


​* Bolsas ERC
As bolsas do European Research Council são o tipo de projeto científico atualmente mais prestigiado na Europa em qualquer área científica. São bolsas individuais unicamente baseadas na excelência científica, sendo a sua avaliação baseada, em 50%, no currículo científico do investigador (que deve estar no topo dos investigadores a trabalhar na Europa) e, em 50%, na excelência do projeto a executar, o seu grau de risco e a abordagem radicalmente inovadora nas fronteiras da ciência adotada no plano de trabalhos proposto. As Consolidator Grants destinam-se a financiar projetos de investigadores que estão em fase de consolidar a sua carreira, e estabelecer a sua própria linha de investigação, tornando-se ainda mais competitivos em termos internacionais, e aumentando a visibilidade da investigação Europeia.