"A Spirito nasceu de uma forma espontânea", assim começou Nuno Freitas a contar a história da marca bracarense dedicada ao fabrico de cupcakes, gelados artesanais, bebidas de café e muito mais. O projeto começou na casa do antigo aluno da Escola de Economia e Gestão e da sua esposa, Nádia Pereira Freitas, que fazia o que tinha aprendido com a mãe, quando era criança. Nádia e os seus irmãos nasceram na África do Sul, no seio duma cultura anglo-saxónica, onde havia tradição de fazer cheesecakes, cupcakes, brownies e crumbles. Sempre que vinham amigos a casa do casal elogiavam aquilo que ela fazia e assim começou o incentivo para o desenvolvimento da sua ideia de negócio. Além disso, em Braga, todos os estabelecimentos eram muito focados na pastelaria portuguesa, não existindo oferta deste tipo de produtos.

cs_spirito2.jpgA família começou a pensar que existia aí uma oportunidade de negócio e decidiram começar a olhar para o conceito e tentar criar algo diferenciador. De início foi a pastelaria dos cupcakes e brownies, mas rapidamente perceberam que, para montar um conceito inovador, precisavam de algo mais e começaram a explorar aquilo que eram as suas origens. Por um lado, os avós de Nádia e dos seus irmãos, Ricardo e Dário, também sócios-fundadores da Spirito​, eram italianos, da província de Caserta (a cerca de 35 km de Nápoles), marcada por uma tradição muito forte de gelados e de leite. Por outro, tanto Nuno como Ricardo tinham estado em S. Francisco e S. Diego, na Califórnia, onde eram clientes habituais da Starbucks, conhecida cadeia de lojas de café, que ambos admiravam. "A equipa achava que o gelado fazia sentido e se enquadrava no mesmo público-alvo que queríamos captar e que o café condizia bem com tudo isto", explicou Nuno Freitas à NÓS Alumni. Começava, assim, a ganhar estrutura uma das bases para o seu projeto: integrar as bebidas quentes e bebidas frias e depois derivar para bebidas de gelado e fruta natural. "Todos esses pontos encaixavam, quer a nível de conceito e de público, quer a nível de diferenciação. Sentíamos que no mundo era difícil encontrar estas três características, na vertente artesanal. Com este contexto, também se anulava a sazonalidade porque no verão conseguíamos vender mais gelados e bebidas frias e no inverno mais pastelaria e bebidas quentes".​

Depois do conceito estar bem consolidado, foi preciso fazer muita pesquisa e bastante formação. Nessa fase, dedicaram-se a viajar e conhecer outros projetos e negócios que admiravam, assim como a aprender, através de cursos de cake design na Wilton, em Amesterdão, de formações de barista e cursos de gelado artesal, em Bolonha. Nesta cidade italiana, com mais de 100 gelatarias, Nuno Freitas quis também conhecer aquilo que as tornava especiais. "Depois dessa primeira filtragem, então sentimo-nos preparados para a criação da marca, o que era muito importante, para o primeiro contacto com o público e esse foi o primeiro desafio", disse-nos o ex-aluno da UMinho. 

"Queremos criar uma família a nível de trabalho e, sendo Spirito o nome da família, é muito importante termos esse ambiente.​"

Os quatro sócios fundadores, Nuno, Nádia, Ricardo e Dário queriam conceber um espaço alinhado com aquilo que eram os seus princípios, isto é, em que houvesse um respeito muito grande pelas pessoas com que trabalham e espirito de coesão. Esses princípios foram, desde logo, respeitados, através da atribuição de condições salariais acima da média e evolutivas aos seus funcionários, assim como benefícios colaterais, por exemplo, seguros de saúde integrados. Para a Spirito, a equipa sempre teve um lugar destacado, uma vez que cedo compreenderam que pôr os funcionários em primeiro lugar é uma forma de os ter mais satisfeitos e motivados e isso reflete-se, tanto na marca como no cliente, de uma forma muito positiva. Prova desta satisfação é terem na equipa pessoas que se mantêm, desde o início, com a família Spirito.

Para além de produzirem produtos frescos todos os dias, algo que os sócios consideram ser essencial, a inovação e a capacidade de surpreender é outra das suas caraterísticas e pelas quais são reconhecidos. Desde que abriu as portas, no verão de 2011, a Spirito já lançou para cima de 1000 produtos de pastelaria e mais de 250 sabores, o que representa, em média, um sabor por semana, consistentemente. "Essa inovação permanente traz um conteúdo diferenciador para os clientes e capacidade de os surpreender. O facto de todos os dias termos produtos e sabores de gelados diferentes é para criar essa diferenciação. O cliente quando vem à loja não sabe o que o espera. As pessoas gostam de ser surpreendidas", esclareceu Nuno Freitas. É também nesse fator surpresa em que apostam na página da marca no Facebook, com quase 520.000 "gostos", e que a coloca no top 30 das marcas nacionais da rede social com mais usuários em todo o mundo. ​

 

"Chegar a uma fórmula perfeita, que consiga transportar bem os sabores e que tenha uma textura adequada tem muito pormenor a nível de grama."

A Spirito faz alguma reserva na divulgação das receitas de alguns dos seus produtos. No que diz respeito aos gelados, existe total secretismo, uma vez que, segundo o seu CEO, estas obrigaram a muito trabalho científico. "Chegar a uma fórmula perfeita, que consiga transportar bem os sabores e que tenha uma textura adequada tem muito pormenor, ao nível de grama. Nós fazemos a nossas receitas de gelado em excel." Já na parte da pastelaria, as regras mudam. Com algumas exceções, como, por exemplo, o brownie, já aconteceram partilhas de ingredientes e modos de confeção e é um dos projeto da marca, nos próximos tempos, lançar um livro de receitas. "Há muita gente que nos segue no Facebook e que não consegue chegar às nossas lojas, até fora de Portugal; então, lançar um livro com o que fazemos pode ser uma forma de atingir algo na vida dessas pessoas", acrescentou o alumnus.

A participação no programa da SIC "Best Bakery - A Melhor Pastelaria de Portugal', ainda a decorrer e no qual a equipa Spirito chegou até à fase final, aconteceu também com o intuito de chegar a um público mais vasto. Para a equipa, que no início tinha algumas dúvidas em se inscrever, acabou por ser mais um desafio que resultou numa experiência muito enriquecedora e positiva. Para além de dar uma grande visibilidade à criatividade, minúcia e trabalho envolvido nos bastidores da Spirito, o programa permitiu que a equipa pudesse evoluir através de novos contactos, troca de ideais com outros concorrentes e, sobretudo, da avaliação de chefs de renome internacional que participam nesse programa de televisão. 

Há cerca de dois anos e meio, os quatro sócios entenderam ser o momento de avançarem com o processo de franchising, abrindo uma loja no Porto e outra em Guimarães. A experiência acabou por não correr tão bem como o esperado, o que fez com que ambos os espaços encerrassem pouco tempo depois e, assim, atrasassem o processo de crescimento e expansão da marca. Depois de feito o controlo dos danos, decidiram avançar sozinhos, abrindo uma loja no Porto, inaugurada no passado dia 10 de dezembro. A ideia era romper com toda a experiência passada e, assim, conceberam um espaço completamente diferente daquilo que é a loja atual e em que apenas se repetiram dois elementos originais. A loja portuense é mais ampla, urbana e moderna, já a pensar numa vertente mais adaptada ao mercado internacional. Situada num espaço privilegiado, mesmo no centro do Porto, na Praça Gomes Teixeira, n° 36, tem como público-alvo os turistas e os jovens que frequentam massivamente a zona, tanto de dia como de noite, mas também um público mais criterioso.

 "A ideia sempre foi que a marca pudesse funcionar no mercado externo; esse era o princípio base."

Outra das novidades da loja do Porto é trabalhar com sobremesas empratadas com muita minúcia e complexidade, algumas com 10 passos, componentes diferentes e com 50 ingredientes distintos. Os clientes da Spirito Porto podem ver a zona de confeção dos produtos através duma superfície vidrada e assim acompanhar o processo criativo. Para conseguir chegar a este nível de elaboração, a equipa tem contado com algumas formações e colaborações de chefs conceituados, como é o caso de Carles Manpel,​ já considerado o melhor chef de pastelaria espanhol e que vem, pontualmente, ter com a equipa a Braga. Nuno Freitas sublinhou que "é um projeto que temos que não é propriamente algo para ser rentável, mas o objetivo é ser diferenciador. São produtos caros de fazer e caros para o público, mas a perspetiva é oferecer algo distinto ao cliente, algo a que não estão habituados, que é raro ver-se ainda a nível mundial, mas que queremos introduzir dentro da cultura portuguesa".

O objetivo seguinte será ter uma terceira loja em Lisboa, ainda que sintam que o Porto e a capital tenham espaço para mais do que uma loja. Depois desta etapa, vão querer avançar para o mercado externo, um passo que a equipa quer dar, mas sempre com muito rigor e controlo. "É fundamental termos parceiros locais estratégicos que conheçam o mercado e que nos deem suporte, de forma a conseguirmos ter uma operação estável, com os mesmos conceitos de marca. Queremos trabalhar com empresas que já estejam a operar nesta área, que tenham know-how e que já trabalhem o​​utras marcas", sustentou o empresário. Além-fronteiras, a Spirito pretende continuar, assim, a dar atenção a todos os pormenores e manter o seu traço diferenciador, nunca perdendo o espí​rito espontâneo e familiar que esteve na sua génese, fórmula aliás que tem provado ser bem-sucedida, tornando a marca bracarense numa referência nacional.

Que marcas deixou a Universidade do Minho em si?

Os anos de faculdade são uma parte fundamental da vida de qualquer pessoa, porque acabam por ter um impacto muito forte. Houve áreas que foram muito desafiantes e que me marcaram, sem dúvida. Houve professores que me deram bases e conceitos muito importantes e fundamentais. Quando estudei na UMinho tive oportunidade de fazer um intercâmbio que me abriu a mente, a forma de olhar para o negócio. O facto de ter estado nos EUA, por intercâmbio, foi fundamental porque me deu um lado mais prático. Em Portugal somos muito lentos a decidir e temos dificuldade em fazer as coisas, porque há o medo de falhar. Os americanos não têm problema em falhar. Há uma frase muito conhecida que diz que "ter sucesso é levantar-se mais uma vez do que aquelas que se cai" e é nisso em que acredito. Quer em diferentes negócios, pelos quais fui passando e obtendo experiências diferentes, umas melhores outras piores, quer dentro de cada negócio, houve coisas boas e coisas más. O importante é percebermos que temos de ter a capacidade de, quando uma coisa corre menos bem, não nos focarmos nisso e continuar e seguir em frente. É necessária também uma outra capacidade que é, quando falhamos, conseguirmos suportar a dimensão do falhanço. É importante ter a consciência que, se um negócio correr mal, não devemos ficar em falta com ninguém. Para mim é muito importante arriscar dentro daquilo que são os meus limites e daquilo que é a base para não prejudicar, nem pessoas que trabalham comigo, nem pessoas que estão ligadas à empresa. São fatores que tenho sempre em mente quando tenho que arriscar em alguma coisa ou entro num negócio novo, ou quando temos que partir para uma evolução ou um investimento, como foi a loja do Porto da Spirito. Aquilo que foi o essencial da aprendizagem que recebi na Escola de Economia e Gestão da UMinho e de ter passado pela San Diego State University, foram essas noções claras do aspeto prático, de medidas de controlo, de limite, de pior cenário, de melhor cenário e de poder gerir bem.

Nunofreitas.jpg Que tipo de relação mantém com esta Universidade?

Tive experiências muito boas na EEG​. Lecionei uma cadeira de Marketing e Social Media na UMinho Exec que foi muito interessante e diferente pelo contacto com os alunos. Tivemos aqui na Spirito, também, um caso de gestão em que todos os alunos do último ano estiveram a estudar a marca e tínhamos 12 grupos diferentes a trabalhar, durante 6 meses, com a exigência que isso teve para o nosso lado. Tenho feito, pontualmente, palestras e mentorias, porque é sempre bom poder retribuir de alguma forma e pegar nesse meu tempo e dedicá-lo a dar algum feedback às pessoas. Colaborei num programa de mentoria com o Eng.º António Murta (Managing Partner da Pathena e antigo aluno da UMinho) que foi a pessoa que mais marcou a minha vida, quer a nível da capacidade de trabalho, quer a nível do aspeto prático e capacidade de decisão. Para mim é dos melhores gestores que existem em Portugal e no mundo. É uma pessoa incrível e tive o privilégio de poder, durante seis meses, uma vez por semana, estar com ele, discutir ideias e desafios. Ajudou-me muito em algumas decisões de investimento que fiz na minha vida. A minha primeira decisão de comprar uma parte duma empresa foi tomada com o apoio dele e acabou por ter esse impacto. Assim, se eu poder de alguma forma retribuir, de forma incomparável com aquilo que é a dimensão dele, com a minha visão, com aquilo que foi a minha experiência, poder ajudar algumas pessoas que estão a começar, fico sempre satisfeito por isso, porque acho que devemos dar sem estar à espera de nada em troca.


* Artigo da rubrica Ecossistema de Inovação e Empreendedorismo da News​​letter Nós Alumni, desenvolvido em parceria com a TecMinho ​​

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