Miguel Borges e Firmino Machado, ambos acabados de sair do curso de Medicina da UMinho, cumpriam o internato no Hospital de Guimarães quando foram desafiados a desenvolver um sistema que pudesse reunir informação sobre os doentes com cancro da mama tratados naquela instituição. Com formação em Matemática, Estatística e Gestão e algum gosto por programação, os dois antigos estudantes aceitaram o desafio e começaram a desenvolver aquilo que viria ser a Oncostats.

Durante o ano de 2014 recolheram dados de cerca de 100 diagnósticos de novos cancros da mama feitos no Hospital de Guimarães e construíram uma série de indicadores com base na informação dos doentes. "Este trabalho permitiu depois comprovar que esta instituição tinha qualidade no tratamento de doentes oncológicos e cumpria uma série de critérios, o que fez com que a Administração Regional de Saúde do Norte lhe atribuísse o selo de qualidade como centro de referência", conta-nos Miguel Borges.

No final daquele ano convidaram Roberto Machado, CEO e co-fundador da Subvisual , para se juntar à equipa. Esta empresa de design e desenvolvimento web do alumnus do mestrado integrado em Engenharia Informática deu-lhes o apoio necessário para desenvolver o protótipo inicial e ajudou a criar um grupo próprio que ficou sedeado nos seus escritórios, em Braga. Nasceu, assim, a Oncostats, uma ferramenta que combina conhecimento médico com tecnologia informática, de forma a tornar o diagnóstico de doentes com cancro mais preciso.

A Oncostats é uma plataforma que permite que a informação clínica seja registada de uma maneira estruturada e sistemática e, ao mesmo tempo, seja validada por um oncologista. Os dados reunidos podem ser usados para facilitar o conhecimento que cada médico tem sobre os seus doentes e apoiar a tomada de decisões sobre os tratamentos a prescrever. "Nós fornecemos aos médicos e enfermeiros uma ferramenta que lhes permite estruturar a informação mais importante sobre o doente oncológico, ou seja, aquilo que entra para a base de dados são variáveis validadas por um clínico. Esta característica permite que a taxa de erro associada seja menor, o que é muito relevante quando se trata de tomar decisões que podem ter impacto na saúde das pessoas", explica Miguel Borges à Nós Alumni.


 

Apesar da Oncostats ter surgido em 2014, a start-up só foi criada no final de 2016, após seis meses de incubação na Startup Braga . A jovem empresa está avaliada em cerca de dois milhões de euros e reúne Nuno Sousa, diretor do curso de Medicina e vice-presidente da Escola de Medicina da UMinho e António Murta, Managing Partner da Pathena, como strategic advisors. O investimento feito até ao momento foi suportado por capitais próprios dos fundadores, cenário que pode vir a ser alterado no curto prazo, como refere Roberto Machado: "fomos recentemente abordados por vários investidores e business angels que mostraram interesse na Oncostats. Neste momento temos já um acordo feito com investidores privados que são pessoas muito experientes e que podem aportar valor adicional ao projeto". 

Com este novo investimento garantido, o objetivo da empresa para os próximos 12 meses é estar presente em um a dois terços dos hospitais que tratam doentes oncológicos em Portugal (e que são cerca de 30). Este passo implica ampliar a equipa que, atualmente, conta com três pessoas no desenvolvimento do produto e cinco pessoas na gestão, assim como começar a formar o grupo científico, oncologistas e cirurgiões oncológicos, dispersos por vários hospitais do país, atingindo uma equipa com cerca de vinte pessoas. Está também a ser desenvolvida uma estratégia internacional que passará, inicialmente, pela Alemanha, Suíça, Inglaterra e Brasil, países onde aqueles ex-alunos já estabeleceram alguns contactos com hospitais e empresas tecnológicas.

A longo prazo, os jovens empresários pretendem que a Oncostats continue a dedicar-se à recolha e tratamento de dados clínicos, mas alargando a sua área de atuação e aplicação. Isto porque, segundo Miguel Borges, "a necessidade de estruturar informação clínica e analisar dados para tomar decisões mais informadas sobre a eficácia dos fármacos interessa não só à oncologia, mas a todas as áreas da medicina". Este médico e empreendedor sustenta o potencial desta plataforma que, apesar de ter surgido a partir de uma ideia cujo objetivo era a sua aplicação num hospital, tem agora uma estratégia nacional e a possibilidade de se tornar numa ferramenta capaz de ajudar a tratar doentes em todo o mundo.


Porquê é que escolheram a Universidade do Minho para tirarem os vossos cursos?

Miguel Borges (MB): Eu vinha do curso de Física da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto que era dado de uma forma muito clássica. Não o completei, fiz os dois primeiros anos de uma licenciatura de quatro e decidi mudar, porque não me estava a adaptar àquela estrutura rígida de ensino. Ao mesmo tempo, inaugurou-se o novo edifício da atual Escola de Medicina da UMinho e começava a falar-se e a ser divulgado o seu método de educação. Era um curso com aspetos muito inovadores, de ensino peer-to-peer, uma estrutura aberta em que a discussão era horizontal e não vertical, em termos hierárquicos e em que o aluno podia falar com o professor facilmente; aliás, na sua maioria, os professores eram pouco mais velhos do que nós, porque era um curso muito recente. Foi uma experiência que eu procurei ativamente, porque vivo no Porto e podia ter entrado em Medicina nessa cidade, mas decidi vir para Braga atraído pela estrutura inovadora do curso.

Roberto Machado (RM): Eu ouvi falar da licenciatura em LESI (atual mestrado integrado em Engenharia Informática) quando andava no 9º ano e desde o 10º que queria vir para o curso. Eu sou duma aldeia do Minho e tinha um amigo de lá que tinha andado neste curso e que me falava dele muito positivamente. Acabou, portanto, por ser uma escolha natural. No meu formulário de inscrição só coloquei um curso, porque sabia que, se não entrasse, voltaria a tentar no ano seguinte porque não queria mais nenhum.

Que importância teve, e tem ainda, esta instituição de ensino para o vosso percurso profissional?

MB: Eu tenho sérias dúvidas que estivesse à frente de um projeto destes se não tivesse feito o curso na UMinho ou se tivesse entrado noutra instituição de ensino. Esta convicção está relacionada com sermos lançados para uma forma de ensino que é completamente diferente daquilo que se pratica, não só noutras instituições de ensino, mas também noutros cursos. Foi o constante reinventar duma forma de pensar de alguém que vinha de uma estrutura muito clássica para algo completamente novo. No meu curso só eu e o Firmino é que nos envolvemos com projetos mais "fora da caixa", mas isto deve-se muito à forma como aquela Escola e a UMinho funcionam.

RM: Desde que entrei na Universidade tive o prazer de fazer parte de vários grupos de trabalho. Fui presidente do Núcleo de Estudantes de LESI, fiz parte da Associação Académica da Universidade do Minho, inclusive trabalhei no Departamento de Saídas Profissionais e Empreendedorismo e acabei por me interessar por esses temas. A UMinho deu-me duas coisas: deu-me excelentes experiências e deu-me os meus melhores amigos e isso é algo que é muito importante, isto é, ter pessoas com quem podemos conversar quando enfrentamos novos desafios. Eu e o Firmino fizemos parte de Núcleos de Estudantes e trocámos conhecimentos e depois acabámos por vir para aqui influenciados por um amigo comum; nestes aspetos a Universidade foi extremamente importante para mim.


 * Artigo da rubrica Ecossistema de Inovação e Empreendedorismo da News​​letter Nós Alumni, desenvolvido em parceria com a TecMinho ​​

TecMinho_logoB.jpg