​André Relvas Nasceu em 1974, o ano em que o seu avô Ramiro, o pai Duarte e o amigo Henrique Soares, desembraiaram o projeto Sorema. 
Cresceu em Paços de Brandão e até ao 12° ano estudou no Colégio dos Carvalhos, onde conheceu a rapariga com quem casou (Ana Palmira) e jogou na equipa de voleibol, evidenciando o gosto pelo desporto, que mantém. Licenciou-se em Gestão na Universidade do Minho. 
Tem dois filhos: André, 18 anos, a estudar Medicina e Beatriz, oito anos, que quando for grande "quer fazer o que o pai faz".

Foi com a chegada da terceira geração que a Sorema deu o grande salto em frente?

Não se pode pôr a questão nesses termos. Quando esta nova geração foi embarcando, encontrou uma empresa muito bem alicerçada tecnológica e fmanceiramente, apoiada por uma equipa de trabalho com uma excecional cultura perfecionista em termos produtivos. O trabalho mais dificil e arrojado já tinha sido preparado pelo nosso pai e avó. 

O vosso pai continua no ativo?

Aos 69 anos, ele continua ligado à parte produtiva. É a grande mais valia e referência da Sorema, e um privilégio para nós podermos continuar a contar com o seu apoio, com uma liderança que se impõe pelo seu conhecimento, fruto de uma vida ligada a este setor. 

Ao longo destes 44 anos, o caminho não tem sido sempre em linha reta... 
Começou logo atribulado quando, dois meses antes do 25 de Abril, a empresa foi criada com o objetivo de fornecer a indústria automóvel. Só que, alarmados com a instabilidade pós Revolução, os potenciais clientes deslocalizaram a produção. Os tapetes para casa de banho foram a alternativa, pois utilizavam uma tecnologia similar à dos revestimentos para carros. 

Quando é que deixaram de ser monoproduto?

A primeira diversificação foi nos anos 80, o meu pai entendeu ser imprescindível iniciar alguma complementaridade de produto e iniciou uma confeção de cortinas para banho. 

Nessa altura viviam só do mercado doméstico?

Embora existisse já alguma exportação para a Europa, designadamente Espanha, Alemanha e Noruega, o essencial das vendas concentrava-se em Portugal. O início da aposta nas exportações só veio mais tarde nos anos 90. 

Foi aí que alargaram a vossa oferta a toda a linha de banho?

Identificámos a necessidade de ter uma coleção estruturada com toda a gama têxtil para o segmento de banho quando começámos a participar em feiras, como a Textil Hogar, em Valência, ou a CasaTêxtil, na Exponor. E essa necessidade acentuou-se à medida que fomos criando as marcas... 

Quando aconteceu isso?

Começámos a expor em feiras nos anos 90. A nossa primeira Heimtextil foi em 1998 e nessa altura o conceito de coordenados já era para nós muito claro - e sabíamos que para sustentar as marcas tínhamos de complementar os tapetes com toalhas e outros acessórios para banho. 

Nos primeiros anos deste século, sofreram muito com o choque da concorrência asiática?

Não muito. Nessa altura estávamos com uma forte dinâmica de crescimento, uma coleção estruturada e uma oferta diferenciadora. E em 2005 criámos a marca Graccioza. Temos uma cultura perfecionista, focada no serviço e satisfação do cliente, que nos foi abrindo portas nos segmentos mais altos do mercado e nos preparou para fazer face à invasão de produtos asiáticos baratos. 

O que é preciso para construir uma marca?

É fundamental saber-se o que se quer - para não andar perdido, a desperdiçar recursos e energia - e ter muito espírito de sacrificio e persistência. É como correr uma maratona. 

Qual é o peso das marcas próprias nas vossas vendas?

Representam um pouco mais de metade das vendas. A Graccioza é a marca que mais tem crescido - é na que identificamos maior potencial e onde temos investido mais. 

Qual é a meta?

O objectivo que temos traçado é alcançar 75% da faturação com as nossas marcas, mas sem perder obviamente volume. Ou seja, mantendo o atual nível de vendas em regime de private label. 

Qual foi o período mais difícil da Sorema? A indefinição, nos últimos dois anos em que estivemos associados ao grupo Welspun, que só se resolveu em finais de 2012 quando acordamos a recompra dos 76% que lhes tínhamos anteriormente vendido. Os dois anos seguintes foram igualmente dificeis, pela necessidade de reorganização e alteração da estratégia da empresa. 

O que vos atraiu na Welspun?

À partida parecia uma excelente oportunidade para as duas partes, começando pela complementaridade dos produtos. Na altura, a voz corrente era de que a indústria têxtil não tinha futuro em Portugal, pelo que estabeler urna parceria com um grupo da região para onde a produção ia ser deslocalizada trazia-nos uma segurança acrescida. 

Um negócio win-win... 

Nós esperávamos beneficiar da associação a um parceiro de referência, com uma dimensão equivalente a todo o setor português de têxtil lar. Eles precisavam de uma porta de entrada na Europa e do nosso know-how para uma fabrica de tapetes de banho que planeavam construir na Índia. 

Quais foram os termos do acordo?

Nós ficámos com 24% do capital e, por exigência deles, mantivemos a gestão da Sorema. Fizemos, em parceria, um grande investimento em estruturas comerciais e logísticas, já que iríamos ser a plataforma de distribuição para toda a Europa dos artigos da Welspun. 

Quais foram os primeiros sinais de alarme?

A conjuntura económica não era nada favorável e contrastava amplamente com a estratégia de crescimento traçada. Não demorou muito até percebermos que havia uma grande divergência a nível de posicionamento. Eles estavam muito focados no mercado americano, na venda de grandes volumes, uma estratégia que não era adequada à Europa. 

Porquê? O mercado europeu está muito mais dividido e segmentado do que o norte-americano. Além de que é mais exigente. Percebemos que a nossa identidade, construída com base na criatividade, flexibilidade e serviço, era incompatível com a visão e estratégia dos indianos. 

As coisas começaram a correr mal... 

O investimento na distribuição começava a não ter retorno e originou uma degradação dos resultados. As divergências agravaram-se quando mudou o nosso interlocutor no grupo. Os maus resultados fora da índia precipitaram igualmente uma intenção apressada de concentrar lá toda a fabricação. Isso era incompatível com a qualidade, flexibilidade e serviço que se impunham para a manutenção do negócio.

O divórcio foi fácil?

Bastante simples, mas também inevitável. Eles são pragmáticos, e muito bem preparados ao nível das chefias de topo. Acertámos tudo numa tarde em Londres, no outono de 2012. 
Como estão a correr as coisas nos Estados Unidos onde há dois anos têm uma parceria inédita com a Bovi? O trabalho de construção de urna marca é sempre demorado, as coisas estão a correr conforme o planeado e a apresentar um crescimento continuado. 

Como é que a parceria funciona?

Partilhámos a estrutura comercial e de marketing. Esta parceria é restringida ao mercado norteamericano e para a distribuição das marcas, não abrange o private label. 

Pode ser replicada noutros mercados?

Contanto que se verifiquem os mesmos pressupostos. Estamos muito contentes com a nossa relação com a Bovi. Falamos entre nós de uma forma bastante aberta e partilhamos também informação sobre outros mercados. 

Entretanto, por cá estão a preparar-se para mudar de casa... 

Mudar de casa não, planeamos aumentar as instalações. Ao longo destes 44 anos de crescimento faseado, o layout ficou um bocado confuso e sentimos a necessidade de mais espaço. Precisamos agora de reorganizar um pouco melhor o processo produtivo. 

Em que fase está o processo?

Já temos a localização definida, aqui em Silvalde, e o projeto e orçamentação estão em curso. Planeamos um investimento próximo de dois milhões de euros na construção do edificio e em alguns equipamentos. Gostávamos de ter este processo terminado até 2021. 

Vão aumentar a capacidade?

O principal objetivo não é de todo esse. Os ganhos fundamentais vão ser ao nível da eficiência industrial, permitindo ainda libertar espaço nas instalações actuais para pequenos projetos, bem como alguma diversificação de equipamentos para alcançar uma maior capacidade ao nível do design. 

O design é importante mesmo quando se está a falar de tapetes de banho?

Design e criatividade são fundamentos da proposta de valor que apresentamos ao cliente, para além do serviço. Temos um gabinete próprio, com três designers. A administração está também bastante envolvida nestas áreas, bem como na inovação.

O que há de novo relativamente a inovação?

A última grande inovação são os tapetes My Cotton Cloud que têm um recheio almofadado de espuma que se pode tirar, o que faz com que sejam laváveis. Mas estamos sempre a procurar introduzir pequenas inovações, que nos permitam alavancar o valor perceptível dos nossos produtos. 

Esse esforço compensa?

Compensa, e é imperativo no segmento em que nos posicionamos. Investimos muito nas coleções e no desenvolvimento de produto, porque é aí que vamos buscar os nossos argumentos. Se estou numa reunião e o nosso argumento for reduzido ao preço, há alguma coisa que está muito mal: ou não fizemos o nosso trabalho de casa, ou estamos no cliente errado... 

Qual é a vosso ponto forte?

A nossa maior força é a nossa equipa, com um know-how acumulado de 40 anos de trabalho e urna cultura perfecionista que potencia a qualidade dos nossos produtos. 
Por outro lado, há o investimento em criatividade, serviço e flexibilidade que se impõe neste negócio de pequenos volumes. 

Como é que vão conseguir manter uma oferta diferenciada e subir na cadeia de valor?

As empresas industriais têm cada vez mais urna forte componente de serviços. Apostamos muito na customização: as novas oportunidades passam por aí. Temos diferentes soluções de personalização, que vão do monograma aos bordados, ao fabrico por medida, passando por uma maior variedade.

Não é uma tarefa fácil construir uma marca a partir de Portugal e nos têxteis lar... 

É sobretudo um caminho moroso, mas que há muito traçámos. Trabalhamos para um segmento de mercado diminuto, em que a notoriedade é difícil de alcançar.  Dificilmente alguém chega ao ponto de ir a uma loja pedir um tapete Graccioza. A estratégia que seguimos é muito de sementeira de marca, baseada no design, criatividade e posicionamento em alguns lugares de destaque. 

Um trabalho ingrato... 

A notoriedade que precisamos é mais junto dos nossos clientes profissionais do que do consumidor final. Além de que fazemos um produto de luxo que não se pode exibir como um automóvel, uma mala ou fato. O que vendemos são tapetes e toalhas que vão para a casa de banho lá de casa, a que muito pouca gente tem acesso. 

Como está a correr a vossa aposta na hotelaria?

Não é propriamente uma nova aposta. É um segmento que de momento vale 3% a 4% do nosso negócio. Não competimos em volumes nem em preço. Temos uma coleção dirigida a hotéis boutique e de luxo que está, por exemplo, no Villa Joya e no Ritz de Madrid. 

Quais são as grandes preocupações que tem de momento?

Estar muito atento a tudo quanto se passa ao nível de sustentabilidade, economia circular e digitalização, de modo a tirar o máximo partido dessas tendências - e não perder esses comboios. 

Têm projectos em curso nessas áreas?

Vamos reforçar a nossa presença no online. Até agora estávamos só no B2B. A partir do início deste ano estaremos também no B2C, a vender os produtos da Graciozza directamente aos consumidores finais de todo o mundo.


Entrevista: Jornal T​