Vestuário, transportes públicos ou hospitais são apenas algumas áreas possíveis para o ColorADD. Um sistema de cores para daltónicos, criado por Miguel Neiva. Miguel Neiva não é daltónico, mas abraçou o tema do daltonismo com unhas e dentes, acabando por criar um código de cores universal. Através do ColorADD, qualquer pessoa que tenha dificuldade em distinguir as cores consegue perceber de que tom é uma camisola, ou até qual é aquela carta do Uno. Sim, um dos jogos de cartas mais populares do mundo rendeu-se ao sistema criado pelo designer português. ​O Uno é um dos mais recentes projectos parceiros do ColorADD, através de uma colaboração com a Mattel, permitindo que os daltónicos não fiquem de fora da diversão. Cada carta passou a ter umsímbolo diferente, que remete para a cor da mesma. Segundo o responsável, a versão Uno ColorADD é fruto de um processo fácil e rápido: «Fossem todos assim!», confessa. «Foi sem dúvida alguma a validação do mercado ao ColorADD, a uma escala global», comenta ainda Miguel Neiva, acrescentando que a repercussão desta parceria é enorme, tanto em termos de visibilidade e mediatismo como de alcance, fazendo com que o jogo chegue a um número maior de pessoas. «Para a Mattel também teve grande impacto - na semana de lançamento do jogo nos EUA, registaram-se mais de 210 milhões de interacções nas redes sociais e um incremento nas vendas do jogo de 66%», revela o fundador do sistema.

Actualmente, o Color ADD está em cerca de 70 países, através de parcerias locais e produtos exportados pelos parceiros portugueses. Brasil, EUA, Espanha, Reino Unido, França, Alemanha e Japão são alguns dos mercados destacados por Miguel Neiva, no que diz respeito ao estabelecimento de colaborações. No total, juntando parcerias nacionais e internacionais, o ColorADD pode ser encontrado em perto de 300 projectos, com empresas públicas e privadas, autarquias e outras organizações: Ageas, CGD, Taça CTT, CIN, Viarco, Zippy, Note!, Continente, EPAL, Rock in Rio, Montana Cans, Metro do Porto, Sinalux, Sociedade Ponto Verde, Centro Hospitalar de Lisboa, Museu Nacional do Desporto, Centro de Juventude de Lisboa e Museu do Design de Budapeste são apenas alguns exemplos.

Miguel Neiva explica que o ColorADD é um «produto intangível, que só ganha tangibilidade quando se materializa nos produtos dos outros», num processo de co-criação. E as vantagens não são só para os daltónicos, que passam a ter mais bens e serviços acessíveis; também as marcas e organizações saem a ganhar. No caso da Viarco a primeira marca de lápis a adoptar o sistema, só pelo facto de colocar os símbolos nos seus lápis, não só conquistou mercado em Portugal como exporta inovação. Isto diz-nos que é possível ganhar dinheiro e fazer o bem à sociedade».

Miguel Neiva não quer ficar por aqui, considerando que é necessária intervenção em «todas as áreas em que a cor é um factor relevante de identificação, orientação e/ou escolha». As mais críticas são as dos téxteis/vestuário, transportes, jogos, material de pintar, hospitais e saúde. Por outro lado, há campos onde o sistema nunca pensou chegar: «Confesso que existem áreas/âmbitos onde nunca imaginei ver o ColorADD, nomeadamente na organização do espaço nos cemitérios, onde já é usado.» ​

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Licenciar para crescer

Embora o propósito seja social e inclusivo, o ColorADD tem por detrás uma empresa que precisa de dinheiro - tal como todas as outras. O modelo de negócio desenvolvido tem como objectivo assegurar a sustentabilidade e independência do sistema de cores, permitindo que a equipa se dedique totalmente à inovação e expansão do projecto. As licenças de utilização do código (renováveis a cada quatro anos) são a principal fonte de receita, a par de consultoria na implementação. Miguel Neiva explica que o valor não é fixo, mas sim ajustado à dimensão das empresas e que uma regra é aplicada a todos os casos: não há exclusividade para ninguém. Ao todo existem 10 escalões de licenciamento, baseados no volume de negócios. No que diz respeito a cidades, as licenças são válidas por três anos e o valor a pagar é indexado à população. Para responder a todas estas solicitações de colaboração - que crescem de dia para dia, o ColorADD conta hoje com oito profissionais, que se dividem entre a empresa que licencia o sistema de cores e a ONG ColorADD.Social. São eles que, a partir do Porto, querem «levar a cor aos quatro cantos do mundo, com muita paixão. dedicação e um ambicioso compromisso de melhorar a qualidade de vida a 350 milhões de pessoas», como explica Miguel Neiva.

Como tudo começou

Em 2000, no virar do século, quando Miguel Neiva se viu confrontado com a necessidade de escolher um tema para a tese de mestrado em Design e Marketing, na Universidade do Minho, a ideia do que viria a ser o Color ADD começou a formar-se. «Como designer, vivo sempre com a competência de poder mais do que desenhar "bonitos" objectos. Com a missão de poder promover um mundo mais acessível e inclusivo para todos!» Nesse sentido, surgiu a ideia de fazer algo relacionado com o daltonismo, inspirado em parte por um colega de escola com essa limitação. Quando descobriu que não existia nada no mundo capaz de minorar as dificuldades dos daltónicos, decidiu então avançar com um projecto próprio, até porque «percorrer um caminho não explorado e procurar resolver uma limitação» prometiam ser desafiantes e interessantes, lembra.

Após oito anos de Investigação e Desenvolvimento, com a colaboração de oftalmologistas e daltónicos de vários países, nasceu o ColorADD. Um alfabeto de cores que pretende melhorar o dia-a-dia das pessoas que não conseguem aproveitar ao máximo um mundo onde 90% da comunicação é feita através da cor. «ColorADD permite ao daltónico independência aquisitiva, aumenta a sua autoestima e independência em acções, que até agora apenas poderiam ser feitas recorrendo ajuda de terceiros - incluir sem discriminar... É o que nos motiva e faz acordar todos os dias!», sublinha o responsável.​

 

Tendo começado como um projecto universitário, não podia prever o impacto que o ColorADD teria, apesar de saber que algo do género fazia falta. Antes de apresentar o sistema ao mundo, escreveu artigos que submeteu para validação da comunidade científica, reconhendo assim também o próprio ColorADD junto de quem sabe. «Já não era eu a dizer que era uma linguagem universal, inovadora e inclusiva. Os meus artigos foram aceites em diversos congressos internacionais e publicados. Dei quase duas voltas ao mundo e só aí tomei consciência do que tinha em mãos.»

Entre as distinções que entretanto foi recebendo, Miguel Neiva destaca o convite para integrar a organização de empreendedores sociais Ashoka (o primeiro português) e o Grau da Ordem de Mérito, atribuído pelo Presidente da República em 2015, entre outros. Além disso, o responsável não pode deixar de mencionar as centenas de mensagens que o ColorADD recebe de pessoas de todos os pontos do globo, agradecendo a invenção. Para Miguel Neiva, isto «ilustra a forma como o ColorADD tem sido aceite, tanto a nível nacional como internacional - de braços abertos seja por quem dele necessita diariamente, como por aqueles que têm a capacidade de decidir e intervir positivamente para a criação de um mundo mais justo e acessível a todos». Até porque, como diz Miguel Neiva, apenas desenhou uns símbolos que representam cores. A sociedade fez o resto!

Fonte: Marketeer