​​Sempre quis trabalhar fora do país. Estreou-se em Dublin (Irlanda), onde esteve na AICEP, Embaixada de Portugal e Google. Foi à boleia desta tecnológica que se instalou no país do “tio Sam”.​

Recorda-se do seu primeiro dia na UMinho?

Lembro-me muito bem. Tinha-me mudado do Porto para Braga na noite anterior. A minha família ajudou-me a tratar do meu “ninho” e lá me deixou sozinha, longe de casa pela primeira vez. No primeiro dia participei em atividades de integração. Fui das primeiras a chegar - nervosa e tímida, sem saber o que me esperava. Ao meu lado estava o Ricardo, que é, ainda hoje, um dos meus melhores amigos. Foi inclusivamente um dos meus padrinhos de casamento [risos]!
 
Porquê a UMinho e a licenciatura em Relações Internacionais (RI)?
Decidi que queria esse curso a meio do 12º ano, porque uma amiga mais velha, na altura a estudar RI na UMinho, convenceu-me que era tudo o que eu procurava. Até então estava com ideias de seguir jornalismo, no Porto, de onde sou natural. Sempre adorei escrever e comunicar, mas tinha muitas dúvidas em relação às oportunidades profissionais nessa área. Em Portugal é difícil construir carreira a fazer bom jornalismo e sabia que no estrangeiro a língua nativa podia ser um entrave para o meu sucesso. Quando a minha amiga Joana me falou da RI, pensei logo: "Bom, isto tem tudo o que gosto. Vai abrir-me muitas portas internacionalmente e posso até enveredar por jornalismo político, a minha preferência". Depois, foi só comparar a formação na universidades do Minho e do Porto e a decisão foi muito fácil. Tinha uma média de secundário de 18,4 valores, portanto RI surgiu como única opção no boletim de candidatura. 
 
Como foi a integração?
Ótima e muito fácil. As atividades de integração foram fantásticas nesse sentido, fiz amigos incríveis logo no início do primeiro ano e viver fora de casa ajudou a tornar tudo mais aventureiro e excitante. Só tenho boas memórias desse tempo!
 
Depois da licenciatura, seguiu para o mestrado em Negócios Internacionais. Já tinha uma ideia clara do que pretendia em termos profissionais?
Sim, queria apostar numa carreira internacional. De todas as minhas ambições, incluindo jornalismo e diplomacia, a área da gestão internacional pareceu-me ser a mais atingível. Não o fiz por paixão, foi uma decisão totalmente racional e acabou por dar os frutos pretendidos. 
 
Que momentos e pessoas marcaram mais o seu percurso académico?
Os amigos que fiz e as atividades de integração. Conheci os meus melhores amigos na universidade. Viajamos de propósito para os casamentos uns dos outros e mantemos ativo um grupo de WhatsApp onde comunicamos regularmente. Foi a maior conquista dessa época.
 
Em 2012, ainda durante o mestrado, desistiu de um estágio curricular "mais caseiro" em prol de uma experiência noutro país.
Exatamente! Estava a estagiar numa empresa em Guimarães, mas não me sentia feliz. Durante esse período, abriram as candidaturas ao programa de estágios INOV Contacto e decidi arriscar. Por sorte, fui selecionada para trabalhar na AICEP - Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal e na Embaixada de Portugal, em Dublin, Irlanda. Esta experiência mudou a minha vida pessoal e profissional. Tive o privilégio de contar com o apoio de um responsável que se tornou um mentor e com quem aprendi imenso. Muito por incentivo dele, consegui concluir o meu relatório de estágio e defendê-lo em 2013, terminando assim o mestrado.

“O importante é ter um plano bem definido”

Como surgiu a oportunidade de trabalhar na Google, uma das maiores tecnológicas do mundo? O que começou por fazer?
A Google surgiu, uma vez mais, como uma resposta racional a um plano muito concreto de carreira e de vida. Quando cheguei a Dublin, conheci o Pedro, hoje meu marido, que já trabalhava naquela empresa e ambicionava mudar-se para os EUA. Partilhávamos o mesmo sonho, mas para mim nem era bem uma ambição, porque parecia-me impossível de alcançar. Com a ajuda do Pedro tracei um plano muito claro: tentar entrar na Google ou em alguma tecnológica americana para, depois, obter um visto de residência através de uma mudança interna. Esta seria a melhor forma de conseguirmos viver nas terras do Uncle Sam. Estimámos que levaria dois anos para isso acontecer e assim foi. Candidatei-me cerca de dez vezes à Google e fui a várias entrevistas. Após alguns meses surgiu uma vaga feita à minha medida e não falhei. Entrei na Google em agosto de 2013 e comecei a fazer customer service para o mercado português. Basicamente, atendia chamadas e respondia a emails de clientes portugueses, insatisfeitos na maior parte das vezes com o serviço de publicidade.
 
E sempre conseguiu realizar o seu sonho dois anos depois...
Certo! [risos] Mudamo-nos em 2015 para a Google em Nova Iorque. Assumi no início a função de consultora de exportação na área da publicidade. Hoje sou strategic partner manager.
 
A Google é o sonho americano em termos profissionais?
É um mundo cheio de oportunidades, mas é para quem as sabe agarrar. Trabalha-se muito e duramente, mas o esforço é recompensado ao nível financeiro, de reconhecimento e de flexibilidade. O importante é ter um plano bem definido, saber onde se pretende ir e o que é realmente importante em cada fase da vida. Já é a terceira posição que assumo dentro da Google e todas elas responderam às minhas ambições profissionais. À medida que vou evoluindo, sendo promovida e ganhando mais responsabilidade, tento procurar desafios que me mantêm alerta, ativa e desafiada, sempre. Depois é juntar isso a um equilíbrio de vida maior. Por exemplo, a função anterior exigia-me muitas horas de viagem. Mas quando comecei a pensar engravidar, decidi procurar novas oportunidades, numa equipa diferente, como gestora de parcerias estratégicas para notícias e órgãos de comunicação social.
 
O que vem a seguir?
Sinto-me muito realizada nesta função. Trabalhar com notícias nos EUA, nos dias de hoje, é uma experiência muito desafiante e inspiradora. Faço a gestão de parcerias com o The New York Times, o The Washington Post, a CNN, entre outros, e tenho aprendido coisas incríveis. É uma posição com muita visibilidade interna, o que me permite trabalhar diretamente com colegas seniores. Daqui a poucas semanas terei um novo e enorme desafio em mãos - ser mãe de uma pequena nova-iorquina! [risos]
 
A formação da UMinho tem sido um fator diferenciador no mercado?
A formação em Portugal é muitíssimo focada na execução e isso faz a diferença em diversos momentos-chave. Para trabalhar nos EUA ou em empresas americanas, creio que nos falta alguma capacidade de autopromoção e algum treino para falar em público. São competências importantes que os portugueses de cá são obrigados a melhorar ao longo da carreira, contrariamente aos norte-americanos, que já trazem muita dessa bagagem do seu sistema educativo.
 
“Nunca me senti tão europeia”

Já morou e trabalhou em Portugal, Irlanda e EUA. Sentiu muitas diferenças em termos profissionais e de estilo de vida/mentalidade?
O maior choque cultural foi, sem dúvida, quando me mudei para os EUA. Nunca me tinha sentido tão europeia! A cultura norte-americana é muito individualista, cada um trabalha por si e pelos seus objetivos. Isso fez-me alguma confusão, principalmente por estar habituada a uma cultura focada na socialização, na mentalidade de grupo e nos almoços em família ao domingo. Mas, por outro lado, o foco que os americanos têm nos resultados faz a diferença: os negócios funcionam mais rápido, há menos burocracia e formalidades. Toda a gente se trata pelo nome, por exemplo. Essa mentalidade muda muita coisa a nível profissional e é um caminho que adorava ver as empresas portuguesas seguir cada vez mais.
 
A vida em Nova Iorque é uma azáfama constante?
Sim. Chega a ser cansativo, mas para quem gosta, como eu, é uma maravilha. É uma questão de hábito.
 
O que faz nos tempos livres?
Tento ler regularmente, adoro passear pela cidade, caminhar à beira-rio, experimentar restaurantes novos e praticar desporto sempre que posso. No verão costumo ir à praia, porque o calor na cidade torna-se insuportável, e no Inverno faço esqui em estâncias espalhadas pelo país. Em Nova Iorque há sempre alguma coisa a acontecer, o difícil é não preencher os tempos livres...
 
Qual é a perceção dos nova-iorquinos relativamente aos portugueses e a Portugal?
Estão agora a conhecer melhor Portugal por causa de uma série de artigos sobre o Porto e Lisboa, que saíram em jornais como o The New York Times. Ainda assim, sabem muito pouco da nossa cultura, além de que no Brasil se fala a mesma língua. Alguns ainda conhecem o Cristiano Ronaldo, mas, como o futebol europeu não é o desporto-rei nos EUA, até isso às vezes é difícil...
 
Como é viver nos EUA em plena era Donald Trump?
É como viver no resto do mundo, acho eu. Vivemos tempos estranhos, quase distópicos. A maior diferença nos EUA é que preciso de procurar muito para encontrar notícias que não sejam sobre Donald Trump. O meu cérebro fica muito cansado.
 
Está a mais de 5000 km de Portugal. O que faz quando as saudades apertam?
Já estou habituada a lidar com as saudades - são mais de sete anos fora do país! Falo com a minha família várias vezes por dia, por telefone, por mensagens ou por videochamada - e isso ajuda muito. Estar casada com um português também é uma maravilha, porque falamos português em casa, cozinhamos comida tradicional, procuramos restaurantes típicos sempre que nos apetece, vemos programas portugueses e vamos a Portugal quatro ou cinco vezes por ano.
 
Ainda mantém ligação a amigos da UMinho?
Uma ligação muito próxima com um grupo de pessoas especial. O nosso "núcleo" tem vindo a crescer com maridos, mulheres e filhos e está a ficar ainda mais bonito!
 
Pretende regressar um dia a Portugal?
Claro. Esse é, sem dúvida, "o Plano". Gostávamos muito que a nossa filha estudasse em Portugal, portanto o plano é voltar quando ela for para a primeira classe.

Os gostos de Ana Rocha
Um livro. Gosto muito de ler, mas não consigo não eleger todos os livros da saga Harry Potter. Li-os quatro vezes cada um e ando a pensar fazê-lo de novo! [risos]
Um filme. "Os condenados de Shawshank", do realizador Frank Darabont.
Uma música. "High & Dry", dos Radiohead.
Um clube. FC Porto.
Um desporto. Futebol.
Um passatempo. Viajar.
Uma viagem. São muitas, felizmente, mas o país que mais me surpreendeu foi o Japão.
Uma cidade. É muito difícil escolher uma. O Porto é a melhor porque é Casa, Nova Iorque a mais excitante e o Rio de Janeiro a mais bonita.
Um prato. Arroz de cabidela, feito pela minha avó.
Um vício. Deixar as portas abertas... E não sou de Braga! [risos].
Uma personalidade. Michelle Obama.
Um momento. O meu casamento.
Um sonho. Regressar a Portugal.
Uma curiosidade. O dia em que cheguei a Nova Iorque. Foi a primeira vez que pisei o solo americano.
Uma frase. Dare to dream. É cada vez mais difícil sonhar e acho que se nos tirarem esse atrevimento não sobra nada.
UMinho. Saudade!