Fez parte da primeira turma de Engenharia Biomédica da UMinho. O fascínio pela investigação foi nascendo durante a formação, tendo passado primeiro pelo Grupo 3B's, "uma escola de vida”, depois pelos centros iBET e Immunocore, onde contribuiu para o desenvolvimento de terapias para o cancro. Aos 35 anos, o bracarense é diretor do departamento de Agricultura Celular na Just, que quer ser a primeira start-up no mundo a comercializar carne de laboratório. Está para breve.​

Recorda-se como foi o primeiro dia na UMinho?
Lembro-me vagamente de ir ao campus de Gualtar para me inscrever, abrir conta e ter número de aluno. Recordo-me da excitação pelo início de um novo capítulo.

Como surgiu a vontade de seguir Engenharia Biomédica? 
A UMinho foi a minha primeira opção. Quando concorri ainda não tinha a certeza do rumo que queria seguir. Gostava de áreas bastante distintas, desde ciências básicas, carreira de professor e até jornalismo. Engenharia biomédica atraiu-me por ser uma novidade e por englobar uma série de áreas diversas, como eletrónica, bioinformática, biológica, química, física, engenharia de polímeros, para uma formação bastante global direcionada para a medicina. Fiz parte do primeiro grupo de estudantes deste curso, em 2002.

O que recorda com mais saudade?
Alguns momentos da vida académica, os amigos, o Coro Académico, do qual fiz parte vários anos, e o mundo de possibilidades por concretizar. 

Depois da licenciatura lançou-se para o doutoramento e pós-doutoramento na área de Engenharia de Tecidos e Medicina Regenerativa. Sempre teve esse fascínio pela investigação?
Fui criando ao longo do curso uma relação com a área de investigação, que foi crescendo, amadurecendo, tendo chegado, por fim, ao matrimónio [risos]. O trabalho de investigação requer um tipo de personalidade que encaixa bem no meu perfil.

Esteve ligado durante seis anos ao Grupo 3B’s, considerado um dos melhores centros de I&D da Europa. Como foi a experiência? 
O 3B's foi, na verdade, uma escola de vida que me abriu várias portas. Tenho noção de que fui um felizardo no que toca a financiamento e condições para fazer investigação de qualidade, algo que, infelizmente, nem sempre é possível em Portugal dada a escassez de investimento orçamental nesta área. Sendo um grupo líder na área dos biomateriais e da medicina regenerativa, também me proporcionou bastante exposição internacional e, nesse sentido, aguçou o meu apetite para as aventuras profissionais que se seguiram, como colaborar com a Universidade de Quioto, no Japão. O 3B's foi provavelmente o local de trabalho onde criei maior espírito de família, dada a vasta dimensão do grupo e as pessoas estarem na mesma faixa etária e fase de vida. Bons tempos! 

O que estudou concretamente?

O meu trabalho no 3B’s teve como base o desenvolvimento de biomateriais capazes de estimular a atividade de células progenitoras humanas, através da libertação controlada de fármacos e agentes bioativos. No fundo, para estimular a sua “performance” numa cultura celular in vitro. A minha tese de doutoramento propôs diferentes estratégias de combinação de biomateriais e células estaminais para promover a regeneração de tecidos, como o osso e a cartilagem.

O futuro da alimentação

Do AvePark, em Guimarães, foi para Lisboa e, depois, para Oxford trabalhar numa biotecnológica que concebe terapias para a imunoterapia do cancro. Saber que contribuiu para melhorar a vida das pessoas deu mais valor a essa função?
Já quando estava no Grupo 3B’s tinha muito interesse em investigar na área oncológica, algo que acabou por concretizar-se no Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica (iBET), em Lisboa, onde estive cinco anos, e, mais tarde, na Immunocore, em Oxford, no Reino Unido. Foi altamente motivante e a abordagem daquela empresa britânica é muito interessante.

Como surgiu o seu interesse pela produção de “carne de laboratório”?
Creio que o meu background em engenharia de tecidos desenvolvido na UMinho, associado ao trabalho de indústria farmacêutica realizado no iBET, mais dirigido para a comercialização e produção de terapias celulares, construiu o perfil ideal para abordar esta área. O desafio de poder alterar o paradigma alimentar e o impacto imediato na vida das pessoas é uma motivação muito especial. Fui abordado pelos recursos humanos da “Just”, após ter sido convidado para apresentar o meu projeto num congresso de carne cultivada na Holanda. A proposta foi irrecusável e aceitei alinhar nesta aventura há dois anos.

Para quando a comercialização da primeira clean meat?
Estamos a trabalhar para que aconteça em breve. Estamos apenas pendentes de aprovação das agências regulatórias, sendo provável que fique primeiro disponível na Ásia. Vamos começar com a comercialização de frango em alguns restaurantes de estrela Michelin.

Acredita que o futuro da alimentação passa por aí? Pela confeção de vários produtos em ambiente laboratorial?

Acredito no poder da biotecnologia como estratégia alternativa para a produção de alimentos familiares para o consumidor. O “ambiente laboratorial” é um termo um pouco desajustado, porque a produção de carne cultivada decorrerá em locais que se assemelham a qualquer outra produção alimentar de grande escala. A produção alimentar continua a aumentar para ir ao encontro das necessidades populacionais, sendo necessário procurar alternativas mais sustentáveis sob o ponto de vista ético e ambiental. Não tenho dúvidas de que se trata do futuro.

Que projetos tem em mente?
Continuar a trabalhar na carne cultivada e trazê-la para os mercados internacionais. Este projeto ambicioso vai ocupar grande parte do meu tempo durante os próximos anos.

Mora em São Francisco, nos EUA, há dois anos. Está a gostar?
Tem sido uma boa experiência. Já tinha vivido em Chicago durante seis meses e penso que tenho personalidade para viver nos EUA. Apesar da “má fama”, este país é um exemplo de diversidade e um destino ideal para quem vai atrás de um sonho. Os investigadores são reconhecidos e há efetivamente um mercado profissional que permite uma carreira fora da academia. Há várias diferenças em relação à Europa. Os EUA são uma sociedade mais individualista e segregada, mas que tem muita oferta e onde é possível encontrar um nicho de mercado. Para além da componente profissional, a Califórnia tem um clima excelente e oferece o melhor dos EUA, uma bela paisagem com vastos parques naturais. Uma roadtrip pela costa californiana lembra-me imenso o nosso Portugal, é mesmo muito parecida! 

O que faz nos tempos livres?
Gosto de ir ao ginásio depois do trabalho para descarregar energias e deixar o stress fora de casa. Também gosto de jogar ténis, explorar a cidade, conhecer restaurantes novos, bem como viajar, ouvir música e de vez em quando ir dar um passo de dança [risos].

Regressa a Portugal com frequência?
Tento ir duas vezes por ano. Iria mais se estivesse perto!

O primeiro aluno do curso a fazer Erasmus
Um livro. “As intermitências da morte”, de Jose Saramago.
Um filme. “The Matrix”, de Lana e Lilly Wachowski.
Uma música. “Cancão do engate”, de António Variações.
Um clube. FC Porto.
Um desporto. Ténis.
Um passatempo. Viajar.
Uma viagem. Açores.
Uma cidade. Nova Iorque.
Um prato. A feijoada de carne cozinhada pelo meu pai. 
Um vício. Café.
Uma personalidade. Steve Jobs.
Um momento. O meu casamento.
Um sonho. Uma vida preenchida.
Uma curiosidade. Fui o primeiro estudante de Engenharia Biomédica da UMinho a ir para o estrangeiro no âmbito do programa Erasmus.
Uma frase. “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem”, de Fernando Pessoa.
UMinho. Nostalgia.