Quando não está a trabalhar como optometrista na Opticalia Suil Park, Pedro Sepúlveda pode ser encontrado a enfrentar as ondas do mar. Entrevista com o nosso alumnus da Escola de Ciências da Universidade do Minho.​

Pedro apaixonou-se por Alexandra, enquanto lutava por estabelecer-se como jovem optometrista em Lisboa. Com a mulher que era gerente de uma das lojas onde fazia consultas construiu uma vida em torno da filha e da ótica. É um self-mode man, mas abandonou as ambições desgastantes da vida pelas ondas do mar. Ou melhor, construiu a sua vida profissional numa correria desenfreada. Trabalhava para o seu negócio próprio, enquanto ainda mantinha os compromissos com os seus empregadores de várias zonas do país. Finalmente e quando fazia 60 horas semana de optometria e "cozinhava" a internacionalização, os seus planos mudaram abruptamente. Contraiu malária em Africa e caiu num coma de mais de um mês. Com esperanças magras de vida, foi salvo num último golpe de tratamento e renasceu. No entanto, o Pedro Sepúlveda trazido à luz nunca mais foi o mesmo. “Calma”, é a máxima. E aqui voltamos de novo à areia onde o observámos e fotografámos. Despedimo-nos à porta da sua casa na areia.

Reencontrámo-lo na Opticalia Suil Park, já no papel de optometrista, mas de pele queimada e o relógio desportivo que não deixam dúvidas que Pedro é muito mais para lá da bata branca. À sua volta, o design moderno e envolvente da loja, desenha-se ao ritmo dos ideais que partilha com Alexandra, bem diferenciado das restantes lojas do grupo. Mas os valores estão lá e mais ainda com a crença de que a melhor tecnologia ao serviço da visão é a resposta à melhoria das vidas de quem procura os serviços desta casa. Isso e um serviço de optometria irrepreensível, que olha para lá dos olhos e busca os problemas, as felicidades e, essencialmente, a garantia de que quem se senta no consultório saia sempre melhor. Portanto, é fácil perceber o Pedro fora da ótica. Dá aulas por carolice na Barrinha Surf School, em Esmoriz, faz viagens de um país inteiro de bicicleta com a Alexandra e o sogro e acima de tudo: “quando estou em cima das ondas sei que sou residual, sou vazio. A natureza tem um poder fantástico. Quando estou na água sou pequeno e agradeço aquilo que me está a acontecer, o respirar, o mergulhar e ver preto e depois vir cá cima. Agradeço constantemente esta prenda que o mar me dá.” Obrigado a ti, Pedro, por nos inspirares! 

De que forma estabeleceu a relação com a optometria?
Eu já tinha um objetivo definido quando me licenciei em Optometria pela Universidade do Minho. Entendi através de amigos meus que a imagem da optometria não era muito positiva e percebi que a regulamentação não estava a sair. Decidi que queria valorizá-la! E eu sou ambicioso e isso sim herdei da minha família a nível empresarial, porque de resto, todo o negócio nasceu comigo e com a Alexandra. Depois da licenciatura, trabalhei no Cartaxo, onde exercia em cinco óticas sob marcação e isso deu-me a certeza que esse sistema funcionava bem. imaginei logo ali que quando tivesse a minha ótica seria assim…é que eu sou de Braga mas o trabalho estava todo “lá em baixo”, ou pelo menos os vencimentos eram mais interessantes. Claro que, queria voltar para o norte porque o estilo de vida em Lisboa não era para mim. Passei com a Alexandra um ano inteiro, a pegar no carro ao fim de semana e a vasculhar o país de uma ponta à outra em busca de uma localização para abrir uma loja, sem interferir com outros colegas.

A Alexandra foi mesmo a companheira certa! 
Foi minha gerente numa ótica em Lisboa e foi aí que cruzámos as nossas visões sobre o que queríamos fazer no futuro, ao nível da ótica. Ela queria ter um negócio de ótica e eu queria valorizar a optometria.
 
A Alexandra não é optometrista. 
É formada em relações internacionais, com pós-graduação em Darma de Buda, mestranda em Filosofia, especialidade Religiões e professora de Yoga pela Associação de Yoga Integral de Portugal. Eu sempre fui um apaixonado pela água e queríamos, claro, conciliar toda a nossa vida com a natureza, em particular com a praia. Estávamos quase a desistir da nossa longa procura quando nos apareceu um flyer de que este espaço, em São João de Ver, estava disponível e tudo começou assim há 15 anos. Trabalhávamos em regime non stop, conciliando ainda com os meus compromissos no Cartaxo! Fazia as consultas todas aqui ao sábado e ao domingo.
 
Isso é loucura não?
Sim e de facto há uns anos atrás, levados pela ambição e porque o pai da Alexandra esteve 50 anos em África, pensámos em internacionalizar a empresa, na época da crise em 2010/2011. Foi nesse momento, aliás, que abrimos a loja da Maia. Fiz três visitas ao continente africano e na última apanhei malária. Fiquei internado no hospital Santos Silva e mais de um mês de coma. Não davam nada por mim nessa fase e eu tinha acabado de comprar a casa na praia e pensava que finalmente ia "arrumar" a empresa e contratar equipa...Houve um médico que tomou a decisão de me dar um cocktail de antibióticos e foi o que me fez acordar. Perdi 18 quilos e tive que recomeçar a minha vida em coisas tão básicas como caminhar ou escrever. A minha filha só tinha três anos. Isto fez-me repensar a tal ambição. Trabalhava 50/60 horas por semana e, por isso, hoje sou quem sou e respeito esta minha rotina. Comecei a dizer "basta"! Ganho menos dinheiro, porque pago para ter tempo e para mim vale muito mais. Ainda vejo amigos ligados ao meu antigo registo que querem crescer e crescer, mas tenho sempre presente que se acontece alguma coisa, é tudo em vão e não se vive. De toda aquela agitação, decidi manter a minha colaboração com a óptica David, onde aprendi muito e com quem tenho uma ótima relação. A doença mudou-nos a mim e à Alexandra. Por isso até brinco quando me perguntam à segunda o que vou fazer na quarta. Respondo "deixa-me ver as condições marítimas" (risos). E a verdade é que tudo rola na mesma! Digo sempre, "calma, tenho o meu ritmo e já "não vou a todas"
 
E porquê abrir com um grupo? 
Trabalhei sempre com grupos e, portanto, quando nos aventuramos a solo não fazia sentido abrir a ótica do Pedro e da Alexandra. É que não herdámos nada. Eu abri em 2004/2005 e, ou me associava para ambicionar ir para a frente, ou ia ser aquela ótica de esquina e neste momento já nem existia. Associei-me na primeira fase ao Institutoptico através de um grande amigo meu. Fui associado durante oito/nove anos e cresci sob este logotipo. Depois no que diz respeito à loja do Miramaia Shopping e porque a Alexandra, que trabalhou na MultiOpticas, tinha boa relação com o António Alves convenceu-nos a passar para a Opticalia. Aqui fizemos obras e, naturalmente, também mudámos e aceitamos o desafio da Opticalia. 
 
Gerem a vossa posição com a Opticália de forma especial, trabalhando à vossa maneira. 
Perfeitamente, porque asseguramos o bom nome do grupo e sabemos que eles trabalham bem em nome dos associados. Uma das coisas que gosto da Opticalia é o de facto de o portefólio da linha branca ser muito boa e interessante. O produto tem qualidade e às vezes até acho que algumas campanhas o desvaloriza. 
 
E a qualidade é algo de que não abdica. 
Aqui, apostamos sempre nos melhores produtos em lentes e sempre que há novidades, absorvemo-las. Aliás, a Zeiss lançou agora uma nova máquina, a Visufit 1000, e a 19a do país vem para aqui. Se quero valorizar a optometria e estou agregado a um espaço, tenho que dar valor também àquilo que se disponibiliza na loja. Não posso ter consultas supervalorizadas e depois na loja ter produtos abaixo da média. Ainda me custa aceitar quem valoriza mais o telefone que a própria visão e, por vezes, atuo nesse sentido junto dos meus clientes. Tento despertá-los. E é este comportamento que também me custa observar na ótica. Em Portugal não se aprendeu com os espanhóis e seguimos o caminho do preço. Nós, ou rasgamos esse caminho e associamo-nos a fornecedores que trabalham a inovação do produto e apoiamos os nossos clientes a ter o melhor, ou perecemos. E todas as pessoas podem aceder a bons produtos nem que seja através das soluções de financiamento ou mesmo na base da nossa confiança.
 
Acima de tudo isto, qual é o segredo do sucesso do seu negócio? 
Eu aprecio muito a forma como interajo com o meu cliente e a forma como ele vive o consultório. Resultado: quando tiro férias aqui não se passa nada! É o reverso da medalha. Não posso fazer mais do que 15 dias de férias. Por isso vingo-me todos os dias na água (risos). Digo à equipa que repliquem o que faço, mas no que diz respeito à optometria as pessoas querem falar comigo. Coloquei-a num nível muito alto. 

Falando sobre a optometria, tem ideias fortes. 
Temos consultas só por marcação e cobramo-las, naturalmente, o que valoriza muito o trabalho de optometria. Eu e a Alexandra somos sócios e casados e entendemo-nos desde logo sobre a forma como queríamos trabalhar quando fossemos empresários. Aliás, esta nossa filosofia é tão certeira que cerca de 80 a 90 por cento do volume da prescrição vendida sai do meu consultório. Sou muito crítico e acho que o facto de terem existido os cursos da União Profissional dos ópticos e Optometristas Portugueses em simultâneo com os da universidade fragilizou a nossa posição e a nossa imagem, até mesmo junto dos oftalmologistas. No entanto, é preciso ter-se presente que ao nível do mundo ocidental a optometria existe antes da oftalmologia.
 
E a regulamentação não poderá mudar a vossa posição?
Não, vai separar o "trigo do joio", quem pode e quem não pode exercer. Porque neste país está instalada uma grande salgalhada. 
 
E a Associação dos Profissionais Licenciados de Optometria (APLO) quer ainda que a optometria seja inserida no Serviço Nacional de Saúde (SNS). 
E isto também por causa da dita hipocrisia do discurso de alguns oftalmologistas. Como é possível dizerem que não precisam de nós ou que não temos validade quando a lista de espera por uma consulta é uma vergonha? Quem não tem dinheiro para ir a uma consulta privada submete-se a esperas de cerca de um ano no SNS. É que existem cerca de 400 oftalmologistas, mas há mais de 1300 optometristas licenciados. 
 
Que desfecho terá a optometria? 
Vai ser agressivo para este governo, que quando está na oposição nos oferece a regulamentação e quando está no poder "corta-nos as pernas'. Estamos habituados a isto há mais de 15 anos.
 
Quando diz agressivo a que se refere? 
Acho que vai haver agressividade no sentido em que nos vamos impor pela via jurídica. Neste momento temos um grande jurista que nos garante que a nossa situação é inconstitucional, por falta de ação e por omissão. Portanto, o governo sabe que estes cursos são feitos na universidade, que os profissionais existem e exercem e depois não faz nada e omite a atividade. Isto é inconstitucional e acho que por aqui vamos conseguir. E já tinha defendido na APLO que devíamos levar esta situação a Bruxelas, porque uma coisa é um país que não temo curso superior e os optometristas devem ser regulados, outra é estarmos em universidades públicas há 30 anos e não sermos regulamentados. Não faz sentido e ainda por cima 70 por cento da população é consultada por um optometrista. São dois milhões de consultas por ano! Estes números falam por si. 
 
Portanto é uma situação desgastaste para toda uma classe. 
Para mim é frustrante e às vezes apetece-me vender tudo e surfar todo o dia (risos). Estou cansado desta luta. Eu valorizo muito a optometria, porque senti nos meus pais o que custou dar-me a formação que tive. Também gosto muito de lidar com as pessoas e com o olho, que é um órgão muito valorizado. Não concordo com aquele optometrista que vai vender. Deve participar da vida da oficina, isso sim. Também me faz confusão o facto de alguns óticos se aproveitarem desta falta de regulamentação para pagarem mal aos optometristas. Isto existe infelizmente!
 
E na ótica o que atormenta o setor? 
Já critiquei bastante, mas acho que acrescento a banalização do serviço da ótica. O produto está lá, é ótimo. Apercebo-me através dos fabricantes que a tecnologia envolvida é brutal e o investimento é avultado. Agora, pensar que isto é a minha arte e que algum dia viria para aqui banalizar aquele investimento? Levo-a, sim, ao máximo e dou a entender o que ela, de facto, vale. 
 
Que futuro sonha para as suas Opticalias? 
Sinto-me responsável por dez vencimentos e por dar alegrias às pessoas que estão aqui comigo. Premeio muito, porque tenho a sensibilidade de retribuir o bom trabalho. Os meus colaboradores o ano passado tiveram 17 ordenados. Ou seja, distribuo a riqueza da loja como prémio de objetivo. Não os quero perder e quero-os felizes. 
 
E o seu sonho é? 
Não ter horário para nada! [risos] Ou melhor, quero a continuidade, sem dúvida! As vezes vejo pessoas que abriram os seus negócios na ótica ao mesmo tempo que eu e até cresceram para sítios onde me imaginei e depois de repente olho melhor e penso 'tem 8,10.12 óticas!?" Parece um jogo da minha é maior que a tua! [risos] Eu prefiro concentrar tudo na mesma casa. Não consigo replicar esta qualidade de serviço. A riqueza desta casa somos nós. 
 
Como prevê o futuro da ótica? 
Fantástico! A geração mais nova que se está a instalar no mercado é extremamente tecnológica, mas terá que acompanhar, de alguma forma, quem já está no mercado e, nesse sentido, o optometrista será sempre uma peça crucial. Nós que já cá estamos também teremos que estar a par da inovação e da tecnologia para não ficar para trás. Estou atento e acho que a determinada altura algumas questões vão-me ultrapassar, como a pessoa pegar no telemóvel, colocá-lo em frente a si e sair a prescrição dos óculos. E depois ter em casa uma impressora 3D e os óculos saírem prontos. Mas mesmo neste cenário, vai sempre faltar o optometrista. 
 
Entrevista: Revista Lookvision